Vim embora da roça pensando:
“assim caminha a humanidade”,
e as Empresas?
O ambiente era de um velório na roça. Sujeito engraçado,
querido, lendário, morreu. Se era popular? É claro, o velório tava cheio de
gente, ainda mais velório em casa. Vamu
bebê fulano lá na casa dele! Assim se fala no interior.
A prosa iniciou-se com um cumprimento: oi cê tá bão? Há quanto tempo não nos vemos! Pois é faz uns 30
anos. Pois é, trinta anos atrás eu estava com 30 anos, você hoje tem quantos
anos? O outro prontamente disse 75. Então nossa diferença é de 15 anos, tô beirando os 60, exclamei!
A conversa foi evoluindo. Quando eu tinha 30 anos você tinha
45 e eu vinha aqui passear e achava você velho pra caramba. Isso; acho eu, é
porque sou de cidade grande, vinha aqui nessa roça passear. Andava na moda, tênis, calça jeans, óculos
escuros, boné invocado, camiseta certinha no corpo, não tinha nem barriga. E
você, vestia-se como está hoje, calça de casimira e camisa de tecido
convencional, boco moco. Desculpe a
sinceridade, mas acho isso mesmo, você é meio boco moco. Concordaram.
Mas me diga, quem é que envelheceu mais? Pensa bem! Se o boco moco aqui tinha 45 e você 30, então valia uma vez e meia você. Agora eu tenho 75 e
você 60, faça a conta, você tá me apanhando, você é que está ficando velho.
Nada pude fazer, ele me trucou,
realmente o boco moco tava certo, 75
dividido por 60 não dá nem número inteiro. Fiquei com uma sensação de velho.
Ficamos ali, jogando conversa fora, perguntei sobre aquele
lavrador que saia lá do seu canto onde nem luz tinha para vir até a venda do finado tomar umas. Lembramos; o
dito cujo chegava lá na venda batia
no lombo do burro e o burro voltava sozinho lá pro canto escuro no meio do
mato. Lá pro meio das tantas o lavrador ia embora, a pé, trupicando nas pedras e falando o nome vulgar da genitália
feminina. Isto depois de ter falado o palavrão pela enésima vez lá na venda, com a boca cheia, várias vezes. Teve
até caso de um turco que jurou o lavrador de morte. Toda noite a mesma coisa, o
lavrador ia embora rua afora, trupicava
e gritava o palavrão. Foi jurado de
morte. Se ele trupicasse na frente da
casa do turco falasse aquele palavrão debaixo da janela de suas três moças, morria.
Não deu outra, o pobre labrador tomou umas, ia voltando a pé e trupicou, gritou: tem jeito não turco, é
ela mesma! Morrer não morreu, foi me dito, tá vivo até
hoje, mas não anda mais de burro, só de cadeira de rodas, precisa sempre de um
apoio um parceiro forte, inteligente e que tenha boa vontade. O burro já
morreu.
Bom; a conversa voltou aos trilhos, a roda aumentou, e o
sujeito que havia me trucado, o boco moco, resolveu contar a conversa
para os outros. Não deu outra, um habilidoso negociante contou um caso
semelhante. Era um sujeito de 60 anos, havia lhe tapeado quando ele tinha 20
anos. Foi numa venda de gado, coisa de por o gado em um pasto emprestado e o
ancião ao invés de vender o gado dele vendeu o gado do jovem negociante que
estava em seu pasto. Daí houve um acordo e o jovem ficou conformado, respeitou,
pois o ancião tinha 3 vezes a sua idade. Daí a mais exatamente 20 anos o
experiente negociante já com 40 anos foi tapeado de novo pelo ancião, à ocasião
com 80 anos. Tinha o ancião liberado a porteira para que ele levasse um gado,
quando tinha pesado outro gado. Levou gado magro por gado gordo. Nesta não teve
jeito, voltou lá e desfez o negócio dizendo: daquela vez ocê valia 3 de eu, agora não, cê tem 80 e eu 40, portanto
não o respeito tanto, você só vale 2 de eu!
No trilho a conversa seguiu, chegou o pai do jovem negociante
e falou: quando você nasceu eu tinha 20 anos, eu valia 20 docê. Você quando tinha 10 anos eu tinha 30; só valia 3 docê. Ficamos perplexos, “assim caminha
a humanidade”, era a frase clássica que veio a todos, na reflexão.
Vim embora da roça pensando: a vida empresarial é assim
também. Algumas empresas ficam estabilizadas enquanto as outras vão se
aproximando em valores os mais diversos como marca, tamanho, mercado. Temos exemplos de tradicionais empresas
gigantes que perderam espaço para jovens empresas e sucumbiram. Realmente, há
empresas mais antigas que eram várias vezes maiores que outras mais novas e
menores e foram diminuindo ou ficaram estagnadas enquanto as mais novas
cresciam. Há ainda empresas tradicionais que para continuarem ativas tiveram
que buscar parcerias. Já não é nem absolutamente certo que uma empresa deva
almejar a sobrevivência - pelo menos nos moldes em que foi criada.